O Jornal da Globo, transmitido no horário espremido entre o fim da noite e comecinho da madrugada, exibiu nesta última semana uma interessante série de reportagens intitulada “Gerações”.
Nela, traçou o perfil das gerações modernamente definidas como BB (“baby boomers”, composta pelos nascidos entre o fim da Segunda Guerra e a metade da década de 60), geração X (de quem nasceu entre a segunda metade dos anos 60 e nos anos 70), geração Y (formada pelos nascidos dos anos 80 até meados da década de 90) e geração Z (nascidos em meados da década de 90).
A reportagem busca mostrar o malabarismo que algumas empresas e instituições têm feito para acolher, manter e impulsionar a galera da geração Y. Toda uma configuração hierárquica empresarial vem sendo remodelada a fim de aproveitar ao máximo o potencial dessa turma jovem. Afinal de contas, eles “progridem rápido e mudam facilmente de emprego em busca de crescimento”, como afirmou o jornalista William Waack.
Outra curiosidade relacionada aos jovens foi citada pelo comentarista de economia Carlos Sardenberg. Em gráfico, elaborado com base numa recente pesquisa, mostrou quais as principais aspirações dos jovens profissionais. A ordem é a seguinte: 1) Subir na carreira 2) Equilíbrio entre vida pessoal e profissional 3) Desafios 4) Trabalhar com quem possa ensiná-los e, acredite, apenas em nono lugar 9) Salário. O jovem não quer, como muitos pensam, apenas farrear, curtir e gastar. Eles querem uma oportunidade para mostrar que também podem fazer; e fazer bem.
Empresas da Europa e América, ao notarem todo este potencial, decidiram investir. E investir alto. De multinacionais a empresas locais, é cada vez mais comum ver jovens nos corredores das instituições vitoriosas. Bom exemplo é o bilionário website Facebook (site de relacionamentos virtuais) que já tem mais de meio bilhão de usuários no mundo inteiro. Seu criador e proprietário: um jovem simples de 26 anos que alcançou, com esforço e talento, posição entre os bilionários do mundo.
Mas veja que nem todo solo é fértil. Alguns países, como o Japão, acharam melhor fazer o caminho inverso. Afinal de contas, dizem eles, “jovens geralmente são imaturos, inexperientes e sem responsabilidade”. Neste país oriental prioriza-se o sistema de hierarquização vertical inflexível, baseado apenas na idade. A lógica do sistema é simples: os mais velhos mandam e os mais jovens obedecem. A promoção em cargos e funções se dá por tempo de serviço e não por mérito de trabalho. Esse modelo, segundo a reportagem, é baseado num sistema que teve origem no século XVI, quando o Japão era comandado por chefes militares, os shoguns.
Dessa forma, os jovens são fria e impensadamente descartados dos cargos de chefia e gerenciamento das empresas japonesas. Resultado: a poderosa geração Y começou a abandonar o país. Para piorar a situação do Japão, o atual ganhador do Nobel de Química, o japonês radicado há 40 anos nos EUA, Ei-ichi Negishi, recomendou aos jovens japoneses que saíssem imediatamente do seu país, como ele fez, porque, no país onde nasceram, não haveria futuro para eles.
Ao ser defrontado com todos esses dados e informações comecei a refletir sobre nossa estrutura denominacional. Ponderei sobre qual tipo de sistema temos adotado: o das vitoriosas mentalidades européias e americanas (embora saibamos que eles têm lá suas falhas e deficiências, certo?!), ou o sistema adotado por países inconseqüentes e exploradores como o Japão.
Desejei entender como a denominação encara a juventude batista brasileira. Como ponto de partida, busquei resposta para as seguintes perguntas: como as igrejas locais olham para a juventude e como investem nos seus potencias vocacionados (neste caso, especialmente os vocacionados ao ministério pastoral)? As conclusões são deprimentes e preocupantes. Basta uma rápida e superficial análise, a começar pelas igrejas locais, para que se perceba que pouco ou quase nenhum investimento tem sido direcionado à nossa geração Y.
Maioria das igrejas acredita que reuniões de “unijovem” aos sábados à noite, dois retiros semestrais e um congresso anual de jovens têm poder para resolver a situação. Quanta ilusão. Fato é que temos uma geração pós-moderna, virtual, inteligente, ágil e multifocal para lidarmos, mas falta-nos preparo para corresponder às suas expectativas.
Nosso investimento na geração Y batista é ínfimo, e nossas ferramentas de trabalho são medievais. Utilizamos, nas atividades com os jovens de hoje, as mesmas ferramentas e estratégias usadas com os jovens da década de 50. E o que é pior: esperamos resultados positivos. E o tiro, como sempre, sai pela culatra. Como resultado óbvio, temos quase que uma geração inteira de jovens batistas sem amor denominacional, sem compromisso com o Reino e sem o menor interesse de freqüentar nossos encontros eclesiásticos (embora haja raríssimas exceções Brasil afora).
Cabe aqui uma importante observação: Precisamos redescobrir, biblicamente, a abrangente amplidão dos conceitos vocação e chamado. Também precisamos desconstruir a má compreensão que durante décadas espalhou por aí que apenas missionários e pastores eram vocacionados. Devido a este equívoco, centenas de jovens batistas com outras belíssimas vocações sentiam-se inferiores, inúteis e inabilitados para o trabalho no Reino. Além da flagrante injustiça, configurou-se ainda como um gigantesco desperdício denominacional. Não é de se estranhar que, no cenário nacional, nossa expressão nas áreas da saúde, educação, políticas sociais, artes seja definida como discreta ou inexistente. Nosso legado atual, neste âmbito, é pífio (especialmente se comparado com o cenário denominacional de algumas décadas atrás).
Oramos e clamamos aos céus que fortaleça nossa denominação e a faça ter vida longa. Em contrapartida, contribuímos e enviamos cada vez menos vocacionados às casas teológicas. As desculpas são as mais variadas possíveis: “seminários perderam a visão”, “não há mais vocacionados”, “seminaristas são preguiçosos”, “a igreja não tem dinheiro” e por aí vai. Há um desinteresse generalizado em se investir nos jovens que serão, em pouquíssimo tempo, pastores e líderes da nossa denominação. Sentiste o drama?!
Enquanto empresas “seculares” investem (inclusive financeiramente) para que seus funcionários façam MBA internacional, pós-graduações, reciclagens, mestrados e uma infinidade de aprimoramentos, ainda batemos cabeça se devemos ou não, como igreja local, enviar seminaristas para nossas “Casas de Profetas”. Depois ficamos a nos perguntar como é que ainda há tanta igreja batista sem pastor nesse Brasil… Haja paciência!
Curiosamente, quando se trata dos nossos filhos a história é outra: se não há faculdade boa aqui, logo achamos uma noutra região do país. Se falta dinheiro, tratamos de fazer hora extra ou conseguir outros meios para garantir a faculdade dos nossos herdeiros. A gente se vira e faz o possível e o impossível pois aquilo é prioridade para nós. Mas quando se trata dos jovens da denominação, achamos pesado e desnecessário investir no aprimoramento acadêmico.
Exemplo claro disso são os jovens seminaristas com sérias dificuldades para iniciar, manter ou concluir seus cursos teológicos. Uma rápida pesquisa entre esta categoria de vocacionados atestará o que se afirma aqui: maioria deles não tem a menor condição de investir dignamente na realização dos seus cursos. Falta dinheiro para mensalidade, livros, congressos, e, pasme, até para alimentação de alguns.
Alguém poderá argumentar: é correto balizarmos ministérios cristãos com lógicas empresariais? Não. Não é este o objetivo. Creio que vocação ministerial, especificamente a pastoral, não deve ser encarada como negócio ou comércio. Disso não tenho a menor dúvida. Mas acredito, irrevogavelmente, que uma estrutura básica é necessária para que tal vocação exista e seja desenvolvida.
Receio que, assim como fizeram com os jovens do Japão, façam também com os jovens batistas. Temo que olhem para eles e digam a mesma coisa que o Nobel de Química Ei-ichi Negishi disse aos jovens japoneses: “onde vocês estão não há esperança de futuro para vocês”. Qual será a reação deles? Olhe ao seu redor e veja. A resposta está estampada na quantidade de jovens que verdadeiramente conhecem e tem optado por vestir a camisa denominacional.
Francisco Helder Sousa Cardoso